9 de jun. de 2015

A violência no cenário esportivo


Alguns autores afirmam que os esportes integram vários tipos de competições que envolvem força física ou simbólica, e, portanto, que podem ter ações que podem ser percebidas como violentas (GARRIGOU e LACROIX, 2001).
Entende-se o conceito de violência no esporte, como o uso da força física e/ou do constrangimento psíquico para obrigar alguém, a agir de modo contrário à sua natureza e ao seu ser, dentro do ambiente esportivo, perpetrado, quer seja pelos praticantes ou pelos espectadores (CHAUÍ, 2001, p. 38).
A violência, enquanto fenômeno do campo esportivo pode ser considerada como um processo social-cultural complexo, no qual intervêm fatores estruturais, ideológicos, financeiros e culturais.
Zaluar (1991) afirma que o fenômeno da violência esportiva também pode ser caracterizado quando um, ou vários atores agem de forma direta ou indireta, maciça ou espaçadamente, causando incursões a uma ou mais pessoas, mesmo que em graus variáveis em sua integridade física, moral, material ou em suas participações simbólicas e culturais.
Portanto, os ciclos de violência são configurações formadas por dois ou mais grupos, processos de sujeições recíprocas que situam estes numa posição de medo e de desconfiança mútua, passando cada um a assumir como natural, o fato de um de seus membros poderem violentar, o serem violentados pelo outro grupo, caso estes tenham a oportunidade e os meios para fazê-lo.
O contexto histórico da violência esportiva se traduz a reboque das sangrentas batalhas no Coliseu da Roma antiga, que se iniciaram em função da política dos imperadores romanos, que frente ao descontentamento dos cidadãos para com a realidade social da época, viram na – política do pão e circo – uma maneira vil de acalmar a população, servindo-lhes o sangue dos gladiadores, enquanto espetáculo esportivo, e, portanto: entretenimento, acompanhado de comida nos eventos esportivos.
Verdadeira gênese da violência no esporte, que também absorvia e retransmitia a violência social da época, através da ratificação da subserviência da população, frente ao domínio do Estado.
Posteriormente, com a transição dos passatempos ou atividades de lazer a esportes, ocorrida na sociedade inglesa em meados do século XIX, que se relacionou ao desenvolvimento da sociedade sob uma perspectiva global, os ciclos de violência abrandaram, e os conflitos de interesses foram resolvidos de um modo que permitisse aos principais detentores do poder, solucionarem suas diferenças por intermédio de processos inteiramente não violentos, e segundo regras acertadas por ambas as partes.
Para acabar com os ciclos de violência no cenário esportivo, surgiram – as regras. Acordadas por ambas as partes, dentro de um período de longa duração, onde os grupos rivais se respeitavam e entregavam o poder pacificamente aos adversários durante as disputas, tidas como esportivas.
As regras, portanto, surgiram a partir do medo de - extinção mútua - decorrente da violência no esporte. Durante este período, as tensões mantinham-se muito altas e a necessidade ou o medo de destruição recíproca trouxe, também, uma nova forma de governo e de pratica esportiva, onde os adversários deveriam respeitar as regras formuladas por eles, para a conquista do poder/objetivos.
Portanto, foi com o passar do tempo que os grupos perderam gradualmente a sua desconfiança, desistindo da violência e respectivas técnicas, passando a desenvolver novas competências e estratégias exigidas pelo confronto não violento. As técnicas - militares e esportivas violentas - deram lugar às técnicas de debate, a retórica e a persuasão, exigindo um maior autocontrole, caracterizando um avanço da civilização.
Sendo assim, o que caracteriza o esporte moderno para Elias (1994) é a aplicação das regras, coibindo toda e qualquer ação mais violenta, onde, mesmo em modalidades esportivas nas quais o contato físico é mais freqüente (MMA, basquetebol, rúgbi, futebol americano, boxe e etc.) as regras pré-determinam muitas das ações dos praticantes, onde também se observa que além desta relação, que o nível e as formas da violência na atualidade tomam outros rumos, principalmente se for considerado que a violência do tipo – simbólica – substitui a predominante violência física, e está cada vez mais enraizada pelo cultura esportiva, incluindo-se os espectadores.
Como a sociedade contemporânea é altamente competitiva, situação esta, potencializada pelo esporte de alto nível, que fora metamorfoseado pela mídia e pelo poder, transformando-se em esporte-espetáculo. Situação esta que ratificou esta competitividade, já que a complexa divisão do trabalho gera a possibilidade de que os papéis sejam fixados muito mais pelos resultados, do que meramente por atribuições. Este aumento da competição leva a um aumento da rivalidade e da agressividade entre os pares (BETTI, 2008).
Outro fator que potencializa esta situação são os padrões vigentes na sociedade, bem como o monopólio do Estado em utilizar à força física, que não comportam as ações diretamente mais violentas dos indivíduos no seio social, onde a violência então se canaliza para contextos sociais específicos, como os esportes, as escolas, as famílias, o transito, as comunidades, os clubes e outros espaços coletivos, ou então é manifesta de outra forma que não seja a violência física (OLIVEIRA,2009).
É nessa outra possibilidade de violência - a simbólica – onde suas manifestações são predominantemente comportamentais, variando de agressões verbais, pelas ações das pessoas, ou ainda pela discriminação racial, sexual ou religiosa que existe na sociedade, e que agora emanou para os campos desportivos, que mais se tem observado, quando o contexto analisado se relaciona com o esporte (GARRIGOU e LACROIX, 2001).
Particularmente quando remetida aos casos de racismo, onde o relatório das Nações Unidas de 2005 expressou preocupação pelo seu aumento no futebol. Um esporte que pode ser uma ferramenta útil para o desenvolvimento e a paz internacional, mas, ao contrario disto, tem potencializado esses comportamentos sociais indesejados.
Bourdieu (2005) define a violência simbólica, asseverando que ela trata de se manifestar através de ações abstratas de superioridade, de uma pessoa ou grupo sobre o outro. O aumento da violência e dos incidentes abertamente racistas estão ilustrados não só pelas ações de alguns simpatizantes sobre discriminação e xenofobia, mas também são constatadas em comentários e ações de treinadores de clubes que minimizam ou legitimam esses casos.
O fenômeno do racismo no esporte, por exemplo, (um manifestação de violência simbólica) é caracterizado, em geral, por atitudes inconseqüentes, desrespeitosas e hostis para com um outro ser humano, geralmente de cor, raça, religião e etc., diferente a do agressor, que pode se manifestar na forma de agressões físicas ou psicológica, principalmente.
É visível o fato de que ainda não foram tomadas medidas necessárias para chamar à responsabilidade para quem comete graves atos de racismo no esporte, em episódios que apesar de receberam ampla cobertura da imprensa, pode aumentar, sobretudo no futebol, que por sua vez, por ser o mais popular no planeta é um reflexo das sociedades. E, portanto, pode estar cercado dos melhores, como também das piores tendências sociais, a exemplo do racismo, da xenofobia, a violência física, a discriminação, o nacionalismo excessivo e as incivilidades.
Cita-se o exemplo recente do amistoso da seleção brasileira de futebol em 26/03/2011, contra a seleção Irlandesa, onde o jogador Neymar, ao ser substituído no final do segundo tempo, recebeu uma banana atirada pelos torcedores irlandeses.
Pois no mundo de hoje, em que a agenda internacional está dominada pela guerra contra o terrorismo, o temor das sociedades pode motivar atitudes negativas dentro das arenas esportivas em relação aos estrangeiros, negros e etc., fazendo-se urgente uma convocação social e uma mobilização das organizações esportivas internacionais, da academia, na direção de combater a violência, além da conscientização da comunidade internacional acerca do importante papel do esporte nos esforços para o desenvolvimento e a paz mundial.

Considerações finais

Face ao que foi exposto, numa perspectiva de uma análise conclusiva, o presente ensaio afirma que se faz de fundamental importância empreender ações que possam gerar subsídios para novas análises e aprofundamento da temática.
Pois, observa o fato da violência que se manifesta no esporte, no interior das arenas desportivas e no entorno delas, perfazer uma reprodução da violência instaurada nas sociedades e que foi construída ao longo de décadas de subserviência da população ao poder do Estado.
Portanto, tem relações diretas com o poder e é fruto da competição exacerbada e fomentada pela sociedade capitalista, que vê na competição entre os pares a única forma de aumentar a produção do sistema.
A relação de interdependência entre o estágio atual da violência na sociedade, com as práticas esportivas ficou explícita nas colocações do texto, pois, verifica-se que o esporte, com ações isoladas, não coíbe a violência social representada na configuração dos praticantes esportivos, particularmente àquela violência revestida de uma de suas formas mais sinistras – a simbólica - que pode acometer suas vítimas, principalmente aquelas mais vulneráveis e que convivem com situações de vitimização, sujeitando-as a grande sofrimento psíquico e a possibilidade de internalizarem tais experiências por toda sua vida.
Portanto, existe a probabilidade eminente dos indivíduos (vitimizados) internalizarem, negativamente, suas qualidades perante os demais, podendo acarretar em prejuízos na auto-estima, além de outras conseqüências, tais como: dificuldades de relacionamentos sociais e interação com o espaço.
Outra conclusão oriunda do contexto analisado é o fato de quão se tornou comum, contemporaneamente, a violência simbólica no esporte (a exemplo do racismo), porém, esses mesmos atos de discriminação racial não são concretos o suficiente para serem enquadrados como crime, pois, segundo algumas autoridades o racismo é muito complexo, se manifesta de diversas formas e parece estar internalizado no comportamento e no cotidiano das pessoas, particularmente no ambiente esportivo. Externalizado desde uma simples piada, nos apelidos, na chacota, chegando até as manifestações de constrangimento e nas agressões físicas e verbais aos negros, obesos, homossexuais, mulheres, árabes, judeus e nos portadores de necessidades especiais.
Contudo, o ensaio enfatiza que o esporte é uma importante ferramenta de enfrentamento desta problemática, mas, que deve ser enfrentada considerando a polissemia da questão.
Portanto, a rede de interdependência deve ser compreendida na sua totalidade, não se podendo entender, apenas, as ações dos educadores físicos, praticantes e consumidores esportivos, separadamente de outras ações sociais, principalmente no que se refere à violência no esporte e o seu enfrentamento.
http://www.efdeportes.com/efd156/esporte-e-violencia.htm




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